— Eu falei que não ia trabalhar mais para ele e ele me deu um chute na barriga e um tapa no rosto, só que não pegou. E me chamou de 'nego', falou que 'nego' não merecia estar em cima da terra. Isso aí foi o mais humilhante [sic].
Esse é o relato de um trabalhador rural que foi mantido em regime análogo à escravidão em uma fazenda em Campanha, no sul de Minas Gerais. Ele não quis se identificar por medo e conta que trabalhou na propriedade de Paulo Alves de Lima de por três meses sem carteira assinada e que não tinha nenhum dia de descanso.
O produtor rural consta na lista do Governo Federal de empresários autuados por uso de mão de obra análoga à escravidão.
— Lá na roça era de 7h até escurecer. Eu ajudava a tratar dos porcos e depois ajudava a fazer cerca. Ficava o dia todo fazendo cerca no meio do mato. Não tive um domingo de folga nesse tempo que eu trabalhei lá.
Além do trabalho excessivo, o trabalhador conta que foi "contratado" para ganhar um salário mínimo. No entanto, o fazendeiro não pagou o valor combinado nenhuma vez.
— O salário que ele combinou comigo foi salário de maquinista: no primeiro mês ia ser um mínimo e depois, no segundo mês, ia aumentar. Só que eu nunca recebi nem o salário mínimo, eu só pegava o dinheiro da pensão alimentícia dos meus filhos, que é R$ 300.
Por se sentir explorado, o trabalhador rural decidiu mudar e conseguiu um emprego em uma fazenda em Cambuquira, cidade a 27 km de distância. Só que o antigo patrão descobriu e o obrigou a entrar em um carro para voltar à propriedade.
A vítima conseguiu fugir durante a madrugada e andou a pé por duas horas até chegar ao quartel da Polícia Militar em Campanha, onde denunciou a situação de trabalho escravo. Os militares estiveram na fazenda, mas o empresário Paulo Lima não foi encontrado. Esta não foi primeira denúncia contra ele.
Em agosto de 2013, Hélio Costa de Araújo foi à delegacia de Polícia Civil de Varginha e ao Ministério Público denunciar o mesmo empresário. Ele contou que foi ameaçado pelo patrão e que era obrigado a trabalhar todos os dias, de manhã à noite. Lima também foi indiciado por aliciamento de trabalhadores e notificado várias vezes pelo Ministério do Trabalho por descumprimento da legislação trabalhista.
Procurado pela reportagem, o empresário negou que mantenha trabalhadores em situação análoga à escravidão em suas propriedades.
— Eu não tenho nada a dizer porque eu não tenho funcionário nenhum. E, durante o tempo que eu for vivo, nunca mais eu quero ter. Eu desconheço [a denúncia], não tenho nenhum funcionário e as propriedades foram todas terceirizadas.
Fonte: R7, 09 de novembro de 2015.