"No começo, tudo é fácil. Só depois a gente vê que não vale a pena", admite o rapaz de 17 anos ao ser questionado sobre o início da vida no crime. João (nome fictício) cumpre medida socioeducativa na unidade de semiliberdade em Londrina. A ficha de atos infracionais inclui tráfico, receptação e tentativa de latrocínio. Para ele, as amizades e a falta de atenção o levaram a traçar um destino bem diferente do esperado. "É muita tristeza. A gente fica muito sozinho. Quero trabalhar e ajudar minha família", garante. João é um dos alunos do curso de manutenção de computadores e aguarda entrevista de emprego. O colega de semiliberdade também está à procura de uma vaga no mercado de trabalho. Depois de se envolver em um assalto à mão armada e ser apreendido por tráfico de drogas, Marcos (nome fictício), de 16, quer ajudar a mãe. "Agora dou valor a minha família", confessa. No período em que cumpriu medida socioeducativa, o rapaz fez curso de chapeiro. Já o amigo Lucas (nome fictício), de 16 anos, trabalha desde o ano passado e faz supletivo. O primeiro salário como jovem aprendiz rendeu novas roupas, mas Lucas quer mais e pretende guardar dinheiro para comprar uma moto. "Eu nunca tinha trabalhado antes. Ficava na rua o dia inteiro", afirma o adolescente, apreendido após cometer ato infracional equivalente a assalto. A reinserção social e o resgate dos adolescentes da vida no crime desafia as autoridades. Em todo o Paraná, 1.019 jovens cumprem medidas socioeducativas em liberdade e nas 27 unidades de internação e de semiliberdade. Em Londrina, 110 estão nos Centros de Socioeducação (Cense). As duas casas de semiliberdade instaladas na cidades abrigam 18 rapazes, dois deles trabalham como aprendizes, outros dois foram contratados de forma temporária e quatro serão encaminhados para entrevistas de emprego nos próximos dias.

empresas de médio e grande porte a darem oportunidade a jovens com idade entre 14 e 23 anos. Numa tentativa de aumentar as chances dos adolescentes que cometeram ato infracional e favorecer a reinserção deles na sociedade, o governo do Estado oferece cursos técnicos para os que cumprem medidas de internação e semiliberdade. A lei federal não obriga a contratação específica dos que foram apreendidos, mas alguns empresários têm se sensibilizado com a proposta. Os jovens que cumprem medida socioeducativa recebem remuneração de meio salário mínimo regional e o contrato tem duração de 1 ano e 4 meses. Para o diretor do Programa Semiliberdade em Londrina, Gilmar Bragantine Ferreira, as experiências favorecem a mudança de comportamento. "Uma das primeiras coisas que eles querem é trabalhar. Eu percebo que, na maioria dos casos, aqueles que têm essas oportunidades e se qualificam mudam de vida realmente. Aqui nós trabalhamos as responsabilidades, corrigimos comportamentos e preparamos os adolescentes para as entrevistas", explica. Ferreira atua há 20 anos como educador social, 12 deles nas casas de semiliberdade em Londrina. O local conta com psicólogos e assistentes sociais que dão suporte aos rapazes. Cursos técnicos também são oferecidos na própria unidade. Outras capacitações são realizadas na sede da Guarda Mirim, instituição que ajuda crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade em Londrina. Após a preparação e os encaminhamentos, alguns jovens enfrentam a rejeição no ambiente de trabalho. É o que conta um gestor de pessoas de uma empresa de Londrina que preferiu não se identificar para não expor o adolescente em conflito com a lei. Desde 2015, quando os proprietários receberam uma intimação do Ministério do Trabalho para cumprir a lei da aprendizagem, a empresa contratou primeiro contratado foi bem expressiva. No início, ele estava bastante acuado, com dificuldades de relacionamento. Percebemos que ele tinha uma barreira muito maior com mulheres, principalmente, quando elas davam alguma tarefa para que ele cumprisse. Começamos um trabalho com atendimento psicológico e com a ajuda de profissionais da Guarda Mirim. Se por um lado a gente teve sucesso na evolução pessoal dele, as dificuldades técnicas na vida profissional permaneceram, infelizmente. Não deu tempo para essa segunda evolução", lamenta o gestor da empresa. A infância do rapaz foi marcada pelas brigas intensas com a mãe. Os pais perderam a guarda do menino. Tempos depois, o jovem passou a morar novamente com o pai que tinha comportamento agressivo. A aceitação do aprendiz foi tranquila nos departamentos da empresa em que os funcionários possuíam baixo grau de escolaridade. "A rejeição foi maior entre os mais instruídos", constata. Para ele, o convívio na firma foi um grande aprendizado. "No início, eu chegava em casa e chorava. Acho muito válida essa iniciativa. Isso não significa que a gente sempre vai obter sucesso, mas a nossa missão na terra é plantar algo. Se a gente vai colher, é outra coisa. Depende de quem faz crescer. Temos que olhar para o aprendiz como uma terra fértil. Todos merecem uma segunda, uma terceira e até uma quarta chance", garante. A Secretaria de Estado da Justiça, Trabalho e Direitos Humanos (Seju) não soube informar quantos adolescentes que cumprem medidas socioeducativas no Paraná estão contratados como aprendizes.  

Fonte: Folha de Londrina, 14 de fevereiro de 2017.