Dificilmente a próxima e derradeira denúncia do procurador-geral da República Rodrigo Janot contra Michel Temer irá afastá-lo do cargo para que seja julgado pelo Supremo Tribunal Federal.
Mesmo que o Palácio do Planalto não tenha recursos para emendas ou cargos disponíveis a fim de oferecer aos deputados federais que salvarem o excelentíssimo pescoço da guilhotina, ainda assim terá um país a oferecer em troca.
Na rejeição da primeira denúncia, o principal pacote entregue aos parlamentares não foi dinheiro, mas um naco da nossa qualidade de vida. Por exemplo, perdões bilionários de dívidas previdenciárias e o apoio tanto para mudanças nas garantias dos povos tradicionais aos seus territórios quanto para o relaxamento da proteção ambiental atenderam às demandas da bancada ruralista.
O Brasil pode estar quebrado, mas Michel Temer seguirá oferecendo em troca promessas de apoio para mudanças de leis, regras e normas, rifando a qualidade de vida dos trabalhadores e das populações mais vulneráveis, além do futuro das próximas gerações.
Nesse sentido, muita coisa ainda pode ser entregue tanto para bancadas organizadas que defendem o retrocesso – além da ruralista, as bancadas da bala e do fundamentalismo religioso, entre outras. Isso sem contar a bancada e os grupos de pressão do capital, que seguem atuando pela desregulamentação do trabalho e pelo calote bilionário para grandes devedores, mas também em nome da manutenção da desigualdade tributária – que sobretaxa o consumo dos mais pobres para deixar intocada a renda dos mais ricos.
O problema é que a possibilidade de corpos cansados não conseguirem obter sua aposentadoria aos 65 anos porque não atingiram 25 anos de contribuição obrigatória é visto por muita gente nas periferias das grandes cidades como uma espécie de gota d'água. Hoje, os mais pobres, que já se aposentam por idade, precisam ter contribuído com 15 anos, o que o governo quer mudar.
Da mesma forma, a atual proposta em trâmite no Congresso pede que o trabalhador rural da economia familiar contribua mensalmente por 15 anos ao invés de apenas comprovar que trabalhou no campo e recolheu impostos sobre a venda de sua produção, como é hoje. Ou seja, não irá se aposentar. Ambos os grupos acabarão desaguando na fila da assistência social a idosos pobres (BPC), isso se o governo não abandonar a ideia de aumentar a idade mínima de 65 para 68 ou 70 anos, postergando a obtenção, como propôs.
O próprio presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, em evento em São Paulo, disse que o governo não tem os 308 votos para aprovar a Reforma da Previdência na Câmara.
Na atual conjuntura, muitos dos parlamentares que estão aproveitando o momento de vácuo democrático para pilhar o país em nome de seus patrocinadores sabem que não sobrevivem a uma campanha eleitoral tendo dado uma banana às aposentadorias dos mais pobres. Então, vão preferir garantir por sua sobrevivência, dizendo que amanhã é um novo dia. Em outras palavras, há limite para tudo, até para eles.
Michel Temer sabe disso. Mas precisa enrolar seus apoiadores, torcendo para que a economia melhore consistentemente, então segue com o discurso. A verdade é que, por enquanto, a Reforma da Previdência entrou para o campo da ficção como o saci, o curupira e a ética como norte da vida pública.
Fonte: Blog do Sakamoto, 05 de setembro de 2017.