O Brasil vive a febre da Copa do Mundo, que voltou a ser realizada no País após 64 anos. Na preparação para o Mundial, falou-se muito em legado, mas nesse debate o foco esteve no aproveitamento posterior dos 12 modernos estádios construídos ou reformados para o torneio e na melhoria da infraestrutura das cidades que sediam as partidas. Uma questão ainda precisa ser melhor discutida: a Copa pode ser um ponto de partida para a modernização do futebol brasileiro, de forma que ele seja competitivo em relação às principais ligas da Europa e aumente sua contribuição para a economia nacional?
Especialistas acreditam que a influência do esporte mais amado do Brasil no Produto Interno Bruto (PIB) está aquém do que poderia atingir. Segundo estimativa da consultoria Pluri, de Curitiba, em 2011 os esportes representaram 1,6% do PIB nacional, algo em torno de R$ 67 bilhões.
Esse montante diz respeito a valores movimentados diretamente por clubes e entidades desportivas, marketing, mídia, vestuário, serviços e outros itens, e também a impactos indiretos em outros setores importantes da economia, como alimentação, transportes e hotelaria.
Em outros países, segundo a Pluri, os esportes tiveram um peso maior no PIB naquele ano: nos Estados Unidos, o setor chegou a uma participação de 2,1% em 2011; na Inglaterra, 1,8%; na Austrália, 2,3%; e na Nova Zelândia, 2,8%.
O futebol foi responsável por mais da metade do PIB esportivo do Brasil em 2011, ao atingir R$ 36 bilhões. A Pluri aponta que a economia do setor de esportes vem aumentando acima do PIB geral no Brasil, e pode chegar a 1,9% de participação em 2016. Um dos principais responsáveis por esse fenômeno é o futebol: o faturamento dos 20 maiores clubes brasileiros teve uma média de crescimento de 12,3% por ano entre 2007 e 2011.
Marcelo Risso, consultor em marketing esportivo, acredita que o momento é de despertar para uma gestão mais profissional no futebol do Brasil, mas ainda há muito a ser aperfeiçoado. "Pelo que o futebol representa no Brasil, a participação (do setor na economia) é muito pequena ainda. Isso acontece em razão do amadorismo na gestão do futebol no País. Agora ele está começando a ser administrado por especialistas, há algumas iniciativas isoladas. Mas na maioria dos casos o futebol ainda é gerido pelos apaixonados, que nem sempre veem o esporte como indústria, do ponto de vista de uma empresa, e as receitas acabam sendo menores que as despesas. Há poucas fontes de renda: patrocínio, bilheteria e TV. Muitos clubes vivem principalmente das cotas de televisão", critica.
Um estudo apresentado no ano passado pela área de projetos da Fundação Getúlio Vargas (FGV Projetos) estimou que o valor gerado diretamente pela cadeia produtiva do futebol no País em 2009 poderia ter sido cinco vezes maior se os clubes brasileiros adotassem padrões de gestão e rentabilidade comparáveis aos das agremiações europeias.
A análise cita os quatro maiores entraves para que o futebol local atinja esses patamares: insuficiente exploração e desenvolvimento do potencial econômico dos principais clubes e competições; geração tímida de receitas de estádios, que sofrem com baixas taxas de ocupação e valor agregado da visita muito aquém do potencial; aproveitamento pequeno do potencial "exportador" do futebol brasileiro, devido à incapacidade dos clubes nacionais de desenvolver e reter talentos; e reduzida geração de renda e emprego de baixa qualidade por parte dos clubes menores.
"Evidencia-se uma transição não concluída. De um lado, está em questão um modelo de gestão dos clubes que não se adequa às necessidades de um esporte profissional de nível mundial como o futebol brasileiro. De outro, não predominam ainda práticas de administração que reconheçam o futebol como grande vocação econômica nos seus diversos aspectos", descrevem os pesquisadores Fernando Blumenschein e Diego Navarro, autores do estudo.
Fonte: Folha de Londrina, 23 de junho de 2014.